A Amazônia sempre esteve presente na obra da artista visual Adriana Ramalho, mesmo em períodos em que viveu longe da região. Suas telas abstratas tornam gigantescos detalhes de formas orgânicas invisíveis a olho nu, e sugerem os contrastes das cores das águas e da seca, da degradação e da preservação.
Desde que foi convidada aos 17 anos para ser ilustradora do jornal Amazonas em Tempo, a artista nunca pensou em fazer outra coisa que não trabalhar com criação. A escolha de um curso superior, no entanto, foi desafiadora. Manaus não contava com faculdades de artes plásticas, o que a fez optar pelo curso de publicidade. Infeliz com a escolha, ela buscou formação superior em Educação Artística, mas a escola encerrou o curso antes que ela pudesse concluí-lo.
Diante de experiências tão frustrantes, Adriana aceitou a sugestão da mãe e se mudou para São Paulo (SP) para estudar Artes Plásticas, seu grande sonho. Acostumada ao contato permanente com a natureza (o sítio de sua família em Manaus fica a apenas alguns quilômetros da mata fechada), a chegada à metrópole paulista foi chocante, em particular pela verticalização radical da paisagem.
Um dos reflexos dessa mudança foi o despertar de seu interesse pelas mídias digitais, em particular as videoinstalações, que permitiam a abstração das formas verticais e facilitavam grandes formatos. De alguma maneira, a percepção do contraste entre São Paulo e Manaus, os sons da cidade e da floresta, e a sobreposição desse conjunto de elementos paisagísticos foram dando sentido ao seu trabalho.
Assim que se formou, Adriana cursou pós-graduação em design e tecnologia. Para financiar sua permanência na capital paulista, passou a trabalhar com publicidade e marketing. Mergulhada no intenso cotidiano do setor de 2010 a 2016, a manauara se viu cada vez mais distante da criação artística.
Cansada da vida frenética da cidade, ela decidiu se mudar para a zona rural de Ubatuba, no litoral paulista. Vivendo em plena Mata Atlântica, a poucos quilômetros do mar, a artista se reencontrou e se reconectou com o universo da arte. Ela conta ter agarrado o lugar “com unhas e dentes”. Sem internet, telefone ou outros equipamentos eletrônicos, ela pôde enfim retornar ao desenho.
De início, seu trabalho preservou muitos elementos urbanos. Aos poucos, os traços passaram a se voltar para formas orgânicas, como na obra “Garden One”:
A partir de então, a forma abstrata foi ganhando mais expressão em seu trabalho, cada vez mais direcionado à natureza, por influência das paisagens com as quais passou a conviver. Assim, seu repertório foi crescendo e se constituindo como abstração dessas paisagens:
Outro elemento persistente e importante na obra de Adriana Ramalho é o esforço para tornar manifesto também o que não pode ser visto a olho nu, mas que está presente na paisagem. Dando destaque a essas informações, ela constrói outros “países”, experiências e sensibilidades às quais as pessoas podem sobrepor suas próprias vivências e experiências estéticas:
E a tecnologia, que foi suporte para muitas de suas obras iniciais, passou a ser utilizada principalmente para viabilizar pesquisas direcionadas à ampliação dos detalhes e imensa fruição da natureza:
Foi esse olhar que retornou com a artista a Manaus, onde vive hoje e segue em busca de elementos, células, átomos, suas formas e conexões. É também com esse olhar que Adriana tem viajado pelas Amazônias e observado a deterioração de muitas das paisagens de sua infância.
O choque da mudança de ambiente se repete, mas agora se deve ao abandono e à indiferença pela floresta, sentimento refletido na recente série Igapó:
Para ela, a arte é também uma maneira de informar sobre o lugar, despertar reflexão, oferecer uma visão sobre a Amazônia. É um olhar sobre a Amazônia que é diferente do olhar político, científico ou acadêmico, mas que é expressão de todo um universo.