Sabores e saberes: como a rotina alimentar revela identidades culturais na Amazônia
Ao aprender mais sobre a influência do conhecimento tradicional nos alimentos do cotidiano, alunos do Acre aguçaram o senso crítico sobre a realidade da região
Direcionar os estudantes num processo rico de entendimento sobre suas identidades culturais e, assim, despertar um senso mais crítico sobre a realidade ao redor. Este foi o principal objetivo da professora de Filosofia Fabiany Melo, de Rio Branco (AC), na condução do programa Itinerários Amazônicos, com adolescentes do 1º e 2º anos do Ensino Médio da Escola Professor Pedro Martinello.
Para estimular a conscientização dos alunos sobre os problemas que a região enfrenta, Fabiany uniu conhecimentos dos módulos de Ciências da Natureza e Ciências Humanas dos Itinerários Amazônicos e propôs o projeto “Elementos da Natureza” com foco específico nos alimentos típicos da região.
Em entrevista à Concertação, ela conta que o maior desafio foi justamente a falta de conhecimento prévio dos estudantes sobre os elementos naturais e os fatores históricos da alimentação local. “Por mais que a gente viva nesse berço amazônico, a maioria deles não tinha as informações sobre o que de fato acontece na região”, conta.
Para que pudessem começar a entender como as condições da floresta impactam na disponibilidade de alimentos, os alunos precisaram antes se familiarizar com questões como as queimadas. A professora, então, estimulou a reflexão dos alunos, demonstrando que esses temas são relevantes “não só para alimentos, mas em relação a tudo aquilo que faz com que eles possam ter um futuro saudável e num ambiente que possa pelo menos ter um ar de qualidade”.
Fabiany observa também que, apesar de muitos jovens terem ascendência indígena e negra, desconheciam as contribuições dessas comunidades tradicionais para a alimentação amazônida que perduram até hoje. Por isso, outro objetivo fundamental do trabalho foi apresentar aos estudantes que “todos esses alimentos amazônicos que são retirados da natureza contêm um trabalho ancestral histórico e filosófico”, comenta a professora.
Para consolidar esses novos conhecimentos, os alunos desenvolveram um projeto marcado por uma parte teórica, com a leitura de revistas, artigos e uso de jogos, mas também uma parte prática, com uma pesquisa de campo, mapeando alimentos e folhagens típicas da região. Eles aprenderam como esses ingredientes são cultivados e, a partir dessas informações, produziram chás e lambedores (xaropes caseiros) que foram apresentados para toda escola em um dos sábados letivos do calendário escolar.
O processo de transformar os alunos em protagonistas do aprendizado agora continua, à medida que estão se dedicando a cuidar da horta da escola. Para a professora, o principal objetivo de todos esses projetos é incutir nos jovens o desejo de “participar, construir um ambiente saudável e ter a noção de deixar algo para a posteridade”.
O programa Itinerários Amazônicos é uma realização do Instituto iungo, da rede Uma Concertação pela Amazônia e do Instituto Reúna e, em parceria e com investimentos do BNDES, do Fundo de Sustentabilidade Hydro, do Instituto Arapyaú, do Movimento Bem Maior e patrocínio da Vale.